Quarto do Will

- E eu tuas... - disse de volta. Estupidamente, senti as lágrimas voltarem a aparecer. Tentei contê-las. - Sou tão feliz contigo.

- E eu contigo, meu amor. - beijei o topo da sua cabeça e abracei-a contra o meu corpo. - Amo-te mais do que tudo nesta vida Maya. Marcaste-me bem.

O que ele dizia enchia-me de felicidade e ao mesmo tempo tristeza. Se eu morresse, ele sofreria e não queria isso. Escondi o meu rosto contra o seu corpo. Inspirei a sua fragrância masculina.

- Vai ficar tudo bem. - afaguei as suas costas. Eu acreditava naquilo. Maya ia vencer aquela batalha, recuperar-se e voltar a ser a mesma mulher de sempre. - Depois vamos ter a nossa família e os nossos muitos filhos.

As palavras dele eram um consolo. Forcei-me a acreditar nele - Pois vamos - Se bem que eu não tinha certezas se poderia voltar a ter filhos depois do tratamento... - Não sei o que fiz para te merecer.

Eu iria manter-me sempre positivo quanto aquele assunto. E quando ela estivesse em baixo, estaria ali para meter para cima. Ter filhos era uma coisa muito desejada por mim. - Saiu-te o jackpot, é verdade!

Spoiler:

A ideia de ter mini Wills a correr pela casa alegrava-me, dava-me alento. Estava tão apaixonada, não era normal! - Lá isso foi - Puxei-o para mais um beijo - Amo-te.

Spoiler:

Beijei-a no topo da cabeça e apertei-a um pouco mais contra mim. - Eu também te amo. - nunca antes tinha sentido algo semelhante com outra mulher. E dava graças que essa mulher fosse ela.

Spoiler:

Era uma tragédia que pela primeira vez na vida tinha um homem que amava e com quem queria passar o resto da minha vida, mas essa mesma podia ser de curta duração. Tentei não pensar nisso. Beijei os seus lábios e acho que adormeci. Amanhã seria outro dia.

Alguns meses se passaram.
As nossas vidas pareciam ter dado uma volta de 360º. A nossa relação ia de mal a pior. Haviam sempre discussões, o ambiente por vezes tornava-se tão insuportável que eu acabava sempre por ficar mais tempo na oficina e tentava chegar o mais tarde possível a casa, para apanhar Maya a dormir. No entanto, eu continuava a acompanhá-la à quimioterapia. Apesar de tudo ainda a amava e não queria sair do seu lado. Tinha esperança que íamos conseguir dar a volta por cima.

Tornava-se cada vez mais difícil arranjar uma razão para me levantar da cama. Ou mesmo para fazer o que quer que fosse. Se não era o maldito cancro, era o trabalho cada vez mais escasso e a relação com Will que me baixa o ânimo. Nada corria bem. Nada.
Andava cansada por tudo e por nada. Irritativa também. Mas, sobretudo, humilhada. Começara a perder cabelo. Naquele dia aproveitei a ausência de Will (como todos os dias) para ir à rua e fui comprar uma peruca. Experimentei-a quando cheguei a casa. Estava a chorar desde então, desgostada com tudo o que se estava a passar na minha vida. Já nem o meu cabelo tinha!

Naquele dia estava de folga. Aproveitara que ainda era cedo para fazer umas compras e encher a dispensa. Quando cheguei reparei que estava tudo em silêncio e que apenas um choro se destacava. Nós podíamos ter as nossas discussões, mas ainda assim me preocupava. Entrei rapidamente no quarto. - Maya.. - abracei-a contra o meu corpo.

- Não! - Foi a minha imediata reacção. Não queria que ele me visse daquela maneira. Estava feia, e fraca e tudo... Só cada vez menos atraente, se é que ainda o era. Ele que se afastasse. Ele que não olhasse para mim.

Não gostava quando ela se afastava de mim e aquilo deixou-me bastante irritada. Mais uma vez, puxei-a contra mim e como tinha muito mais força que ela, não a deixei afastar-se. - Pára com isso Maya, não sejas idiota.

- Idiota?! - questionei, quase num berro. Estava descontrolada - Não és tu que perdeste a porra do cabelo! Não és tu! Não és tu!! - Desmanchei-me em lágrimas novamente.

Censurei-me pelas minhas palavras. - É só cabelo. - murmurei. - Não acho que fiques menos bonita por isso. - tentei reconfortá-la. Eu achava-a linda de que maneira fosse.

Não conseguia acreditar nas suas palavras. Ele de certeza que já não me achava bonita. Afastei ligeiramente o meu rosto para o poder olhar - Como me podes achar bonita? Já não.

Revirei os olhos. Mulheres, pensei comigo mesma. Sempre preocupadas com algo tão banal. - Pois eu prefiro-te assim. Acordar sempre com aquele cabelo na cara era uma real treta.

Apesar do que ele dizia, eu não me sentia melhor. Suspirei - E acordares com outras a teu lado? Consegues melhor que eu neste momento. Muito melhor. Até fazem fila, aposto - Ironizei.

Aquilo não era o momento ideal para me rir, mas estupidamente foi o que fiz. - Lamento muito desiludir-te, mas nenhuma mulher me faz tão feliz como tu. Não preciso, nem quero acordar ao lado de nenhuma outra mulher que não tu. - beijei-a no topo da cabeça. - Tive uma ideia.

O meu coração aceitava aquilo e rejubilava, mas na minha mente não fazia sentido. Já não.
- O que?

- Fica aqui, não demoro muito. - tranquei-me na casa de banho do quarto e peguei na máquina de barbear. Olhei-me pela última vez com cabelo.

O que raios ia ele fazer agora? Perguntei-me.
Sentei-me na cama à espera.

Não me arrependia de ter rapado o cabelo. Mais cedo ou mais tarde, este iria voltar a crescer e depois, era só cabelo. Depois de me limpar, destranquei a porta e abri-a. - Não te apaixones muito.

De todos os cenários possíveis, aquele não era o que eu estava à espera. Fiquei de boca aberta, sem saber o que dizer ou pensar - O TEU CABELO, WILL! O que é que foste fazer?! Estás louco?! - Mas depois comecei-me a rir.