Quarto do Will

Cocei o pouco couro cabeludo que ainda me restava. - É só cabelo. - disse-o com algum desinteresse na voz. - Mas vá, podes admitir aqui entre nós, que fiquei ainda mais giro.

Eu continuei-me a rir,ciente que se não o fizesse, estaria a chorar. Aproximei-me e passei a mão pelo seu curto cabelo - Talvez. Dá-te um ar mais... badass.

- Talvez? - fiz uma careta. Eu tinha gostado bastante do meu novo visual. E no fundo, aquilo servia mais para a tentar alegrar um pouco que fosse. - Dá? Estou perfeito, como sempre.

Ele estava perfeito, sim. E pensar que ela fizera isto para me mostrar o seu ponto de vista só me fazia amá-lo mais - Estás lindo - Pus-me em biquinhos de pés e beijei-o.

- Eu sou lindo. - fiz um ar convencido que pouco durou. Pousei as mãos envolta da sua cintura e puxei-a contra mim. Queria bem junto de mim. A minha língua deslizou pelo seu pescoço e fiz aí um pequeno chupão.

- É verdade, seu convencido - Concordei, acenando com a cabeça. Quando ele me agarrou e tocou daquela forma, esqueci-me da tristeza da tarde e entreguei-me a ele.

Normalmente àquela hora eu já não estava em casa. Mas a tarde seguiu-se e continuámos ali, juntinhos, deitados na cama. Era bom estar um minuto que fosse em paz e sem discussões. Beijei o topo da sua cabeça.

Aquele tarde pareceu um raio de sol na quantidade de dias negros que estava a ter. Mas duraria até quando? Quando viria a proxima discussão?

Espreguicei-me e fui até à casa de banho. Tomei um banho fresco, vesti uns calções e segui para a cozinha. Iria fazer um preparado especial e bem reforçado. Maya não andava a comer bem e não gostava disso.

Não queria aproveitar o resto daquele dia bom na cama. Agarrei-me às energias que ainda tinha. Fui tomar a banho e vesti algo prático. Desci e fui à procura de Will.

Passaram-se alguns dias, depois daquele encontro com Maya. Andava sempre maldisposto, ficava mais tempo no trabalho e só o pequeno Josh me conseguia tirar um sorriso, com aquela sua doçura e pureza de criança.
Tinha o teste nas mãos. Eu tremia por tudo o que era sítio. Estava trancado há mais de meia hora no quarto. Josh tinha ido com a mãe passear, por isso estava ali sozinho. Respirei fundo algumas vezes, andei de um lado para o outro, inventava mentalmente conversas com pessoas que nem sequer existiam, troquei de roupa porque achava que devia receber aquela notícia de maneira apropriada, comi com a desculpa de que podia ver mal o resultado, por conta de fraqueza ao algo do género e quando fiquei sem alternativas, apanhei coragem e abri o envelope.
Explodi de alegria quando vi aquelas letras bem gordas impressas no papel. O pequeno Josh era mesmo meu filho. Por momentos a imagem de Maya passou-me pela cabeça e aí perdi o sorriso. E se ela não me quisesse de volta por conta disso? Estava disposto a aceitá-la mesmo depois de ela se ter afastado. Tinha medo de pensar naquilo.

Tinha levado Scylla a casa, depois de termos jantado juntos. Passei o jantar todo a pensar em Maya, quase ignorando os problemas da ruiva. Mais tarde, acabei por a levar a casa e ficar na mesma, apenas porque o pequeno Josh fizera intenção de me mostrar a sua nova colecção de bonecos. Eu estava ligeiramente cansado e acabei por adormecer na cama com o pequeno. Só acordei porque o meu telemóvel deu sinal de uma nova mensagem. Era Maya e... errr... suspirei. Que porra de mensagem era aquela? Sem acordar o pequeno, saí da cama e saí daquela casa, indo para o meu apartamento. Atirei-me para o sofá e dormi mesmo aí.

Eu continuava cansado e cheio de dores no corpo. Dormir naquele sofá era um pesadelo. Ia passar pela loja de bicicletas mas desisti. Também desmarquei todas as coisas que tinha no hospital. Tomei um banho rápido e comi qualquer coisa. Ainda estava aborrecido com a mensagem que recebera de Maya. Olhei novamente para o telemóvel e revirei os olhos, atirando este, para longe de mim. Quando ouvi a campainha, segui até à porta, encostando-me à mesma quando a abri.

Tinha entre mãos dois copos de café e uns donuts de um dos cafés a que nós dois costumávamos ir. Sorri ligeiramente ao ve-lo - Bom dia - Aproximei-me para o beijar - Trouxe o pequeno almoço, não sei se já comeste.... estás com má cara William, dormiste bem?

Recebi os seus lábios sem ao menos retribuir o beijo. Vê-la ali, fazia-me relembrar cada palavra sua naquela mensagem. Sorri amarelo e fechei a porta atrás de mim, seguindo para o sofá. - Dormi sim. Estou apenas cansado do trabalho.

Pousei as coisas que trouxera na mesinha da sala. Ataquei logo o meu café. Ele ficou calado por isso decidi eu começar a conversa -...humm, como foi ontem com a Scylla?

Eu não toquei na comida que ela trouxera, não tinha fome, tinha comido algo rápido um pouco antes. Encolhi os ombros. - Normal. Ela contou-me algumas coisas, falámos sobre o Josh e ainda tive algum tempo com ele. E tu? O que fizeste?

Eu dizia a mim mesma para não ter ciúmes de Scylla mas a verdade é que tinha. Minavam-me de uma forma ridícula. - Nada, não fiz nada. Estive em casa. Sozinha. - Frisei um pouco magoada. Tambem tinha passado pelo bar mas isso não referi.

- Imagino... - revirei os olhos. - E durante essa tua estadia sozinha, por acaso tiveste um momento de estupidez ou foi só birra mesmo? - virei-me para ela, encarando-a com a maior frieza do mundo. Estava zangado e não ia esconder isso.

Não estava a compreender a sua atitude e o tratamento que me estava a dar. Só pioravam a minha dor de cabeça - Estás a falar do que? - Perguntei de olhos cerrados, já irritada com a sua frieza.

Inclinei-me sobre a pequena mesa da sala de estar, apenas o suficiente para alcançar o telemóvel e ter acesso às mensagens recebidas. - Estou a falar disto. - mostrei-lhe a mensagem que me tinha enviado na noite anterior e voltei a revirar os olhos. - Que eu saiba, este ainda é o teu número.

Tive de tirar os óculos escuros para ler aquilo. Estava ligeiramente embaraçada por lhe ter enviado aquilo - Estava um bocadinho alcoolizada ontem à noite admito - Devolvi-lhe o telemóvel e olhei-o duramente - Mas as palavras são sentidas na mesma - Só desejava te-las dito pessoalmente e não por uma mensagem daquelas.

- Que bom que assim seja. - sorri cinicamente. Aquilo tinha-me magoado mais do que imaginara. Ainda tivera esperanças que ela me levasse a crer que fora só um mal entendido, mas não. - Ela é mãe do meu filho e isso não posso mudar. Se ela tem algum problema, é claro que tenho que o atender. Não se trata de ter menos respeito ou mais respeito. Trata-se da mãe do meu filho, trata-se do Josh, do seu bem estar e tudo mais. E antes de mais, a Scylla está sozinha, voltou à pouco tempo para Fenny e não tem mais ninguém além de mim.

Que vontade enorme de revirar os olhoos. Acabei por fazê-lo. - Por amor de deus, Will! - Já estava zangada e ia dizer-lhe o que tinha guardado cá dentro - Eu sei que ela é a mãe do teu filho e que tens coisas a tratar com ela mas abre os olhos! Desde que chegou que ela te quer para tudo e mais alguma coisa. Está a usar-te. Aposto que metade dos problemas dela são só uam desculpa para estar contigo.

Estava a começar a ficar ainda mais aborrecido. - Estás a tirar as tuas próprias conclusões sem sequer ao menos saberes das coisas direito. - entortei os lábios. - Achas-me mesmo assim tão ingénuo? Não sou nenhum miúdo Maya, sei mais daquilo que pensas. E depois, mete na tua cabeça: eu podia até passar os dias com ela, que nunca voltaríamos a ter nada.