Sala de estar

Felizmente, e ao contrário do que eu pensava, Dylan acedeu ao meu pedido e por momentos, chegou até a parecer que se estava a tentar acalmar.
- Então pronto, vamos sair daqui.- murmurei, ainda a olhar para o seu rosto, e por muito que me sentisse ligeiramente irritada com ele, não resisti em agarrar-lhe na mão, encaminhando-o até ao meu carro. O meu problema não era ele ter aparecido e enxotado Scott...o que me incomodava realmente era o facto de ele ser tão inconstante e me deixar sempre sem saber o que pensar. Soltei um leve suspiro face aos meus pensamentos e quando dei por mim, já estávamos a chegar a minha casa. Estacionei o carro no mesmo local de sempre, desapertando o meu cinto logo de seguida e depois de sair do meu lugar, dei a volta ao veículo, para ajudar Dylan a fazer o mesmo. Tínhamos vindo o caminho todo em silêncio, mas não fazia mal, algo me dizia que já íamos ter muito que falar mal chegássemos a casa. Subi as escadas ao seu lado, rezando mentalmente para que ele não caísse e assim que consegui abrir a porta, desviei o meu olhar na sua direcção.- consegues ir sentar-te no sofá? - perguntei, tentando ao máximo ignorar a sua respiração que me embatia na face. Pelos vistos nem o facto de tresandar a álcool me fazia querer afastar-me dele. Mordi a parte de dentro da bochecha com força e antes que a coisa desse para o torto, comecei a afastar-me.- eu vou preparar-te um café.

Deixei-me estar sempre em silêncio enquanto ela conduzia até à sua casa. Eu preferia que assim fosse, porque se começássemos a falar eu tinha a certeza de que eu apenas ia ficar a resmungar por causa do Scott. Eu nem queria pensar nele, porque isso deixava-me logo todo irritado e com vontade de lhe bater até ele me prometer que nunca mais se iria aproximar da Emilly. Deixei que ela me ajudasse a sair do carro e deixei que me guiasse até sua casa, enquanto eu ia andando com cuidado para não acabar por tropeçar nos meus próprios pés. - Sim. - eu disse, num murmúrio e com a voz toda arrastada, à pergunta que ela me tinha feito. Suspirei e caminhei até à sua sala de estar, completamente em silêncio, todo aquele silêncio sabia demasiado bem depois do forte barulho que existia no bar onde tinhamos estado. Deixei-me cair sobre o sofá até o meu corpo ficar sentado sobre o mesmo e encostei depois a minha cabeça para trás. Sentia a mesma a andar às voltas e a começar a doer, devido a todo o alcool que eu tinha ainda no meu organismo.

Se em alguma parte da noite eu me tinha sentido ligeiramente tocada com os dois copos de vodka que tinha bebido, essa sensação já estava totalmente superada depois de toda aquela confusão. Mas o que é que ele queria afinal? Tanto afirmava ser o maior mulherengo da escola, e parecia ter orgulho nisso, como no minuto a seguir já estava completamente passado só por me ver com Scott.
- Ninguém te percebe Dylan Watson.- expirei de forma exasperada, enquanto enchia a chávena com café e assim que esta ficou minimamente cheia, voltei a pousar o bule, agarrando na chávena para voltar para a sala. Desliguei as luzes da cozinha, fechando a porta atrás de mim e bastou-me dar meia dúzia de passos para conseguir ver a sua figura recostada no sofá. O pior de tudo isto era que, por muito furiosa que eu me sentisse com ele, não conseguia que me fosse indiferente. E isso era o pior de tudo.- toma, bebe isto, vais sentir-te melhor.- murmurei, depois de me ter aproximado e estiquei a chávena na direção dele. Esperei que agarrasse e fui sentar-me depois na outra ponta do sofá, virada na sua direção. Era agora e ele não me ia escapar.- podes explicar-me o que é que se passou na discoteca? Melhor, o que é que te passou pela cabeça?

Fui apenas desperto dos meus pensamentos quando ouvi a voz da Emilly já junto a mim. Virei o meu rosto na sua direcção e peguei na chávena de café. - Obrigado. - murmurei baixo e logo levei o copo aos meus lábios, bebendo um pequeno gole daquela bebida. Engoli em seco quando ela começou a falar para mim, e olhei-a. - Não viste o que ele estava a fazer? Todo agarrado a ti? - eu resmunguei, como se fosse óbvio o motivo do porquê de eu ter feito aquilo. - Juro que ele me irrita muito, eu não o quero perto de ti, eu...

Não era preciso conhecer Dylan há muito tempo para perceber que a sua postura tinha mudado radicalmente mal o seu cérebro processara a minha pergunta. Todos os seus músculos do seu corpo enrijeceram e a própria expressão facial, arrefeceu. Eu não percebia, aliás, cada vez mais eu percebia menos.
- Tudo bem, ele abusou.- obriguei-me a reconhecer.- mas o que é que tu tens haver com isso? - prossegui, fitando-o firmemente.- tu o quê Dylan? Tu tanto és o maior engatatão da escola como no segundo a seguir te passas da cabeça porque vês outra pessoa agarrada a mim...- abanei ligeiramente a cabeça, para mostrar toda a indignação que sentia, à medida que as palavras me saíam da boa e quando dei por mim, já estava ligeiramente mais próxima dele, de modo a conseguir olhá-lo mais de perto.- o que é que tu queres afinal?

O copo de café que eu tinha nas minhas mãos acabou por ser um pouco esquecido, visto que foquei o meu olhar no dela, perdendo-me na cor dos seus olhos. Sentia-me ainda alterado devido a todo o alcool, e tinha portanto de fazer um grande esforço para conseguir processar na minha cabeça tudo aquilo que ela estava a dizer. - Não quero que ele esteja perto de ti, não quero que ninguém esteja perto de ti a não ser eu. - fui dizendo as palavras de forma rápida, sem desviar nunca o meu olhar do seu. - Gosto de ti, gosto muito de ti e quero-te apenas para mim. - disse rapidamente, sabendo que apenas estava a dizer-lhe aquilo por não estar no meu estado normal.

De tudo o que acontecera naquela noite, do que eu menos estava à espera era da resposta de Dylan à minha pergunta. Pelos vistos, sempre que eu achava que ele já não me conseguia surpreender, ele conseguia. Mordi a parte de dentro da minha bochecha com força, à medida que as palavras que brotavam dos lábios de Dylan faziam sentido no cérebro. Eu sabia que ele só estava a dizer aquelas coisas por culpa do álcool, eu sabia que ele nunca me iria dizer aquilo se estivéssemos numa situação normal mas...era impossível ficar indiferente. Não será porque sentes o mesmo? Abanei a cabeça rapidamente, assim que percebi que os meus pensamentos iam tomar proporções que não me agradavam e quando dei por mim, já o meu corpo estava demasiado próximo do de Dylan. Fechei os olhos durante meros segundos, expirando todo o ar que tinha nos pulmões enquanto o fazia e, mal os meus olhos se abriram de novo, tinha a testa encostada à de Dylan.
- Porque é que eu sinto que amanhã não te vais lembrar de nada disto? - suspirei, subindo calmamente o meu olhar para o seu.- deixas-me tão confusa Dylan.

Engoli em seco, sentindo-me completamente confuso e sem saber ao certo o que pensar, sentia a minha cabeça a andar às voltas, com as palavras que eu tinha acabado de dizer a andarem de um lado para o outro, a repetirem-se mil vezes na minha cabeça. Eu não devia ter dito aquilo, ou talvez não fizesse mal eu dizer. Eu não conseguia pensar direito, porque parecia que o alcool me fazia ficar num estado completamente alterado, sem me deixar pensar em condições. O meu olhar foi parar ao da Emilly, quando a senti agora bastante mais perto de mim, e mordi o interior da minha bochecha. - Eu estou a ser sincero. Estou mesmo. - murmurei, mesmo sabendo que o mais certo era mesmo não me lembrar de nada daquilo no dia seguinte. - Precisamos de dormir Emilly. - murmurei logo de seguida, afastando ligeiramente o meu rosto do seu, apesar de a minha maior vontade naquele momento ser de a beijar, mas não queria fazê-lo. Já lhe tinha dito aquelas coisas enquanto estava bêbado e não ia agora beijá-la também neste estado, preferia fazer isso quando estivesse no meu estado normal, sem correr o risco de me esquecer.

Se há uns meses atrás alguém me tivesse dito que eu iria estar assim, naquela situação, com o Dylan Watson, a minha primeira, e única, reação teria sido rir-me na cara dessa pessoa. Dylan era aquele tipo de rapaz que eu só queria manter o mais longe possível, quer dizer...pelo menos era o que eu achava. Isto era tudo tão complicado, ele era tão complicado. Juntei ligeiramente as sobrancelhas assim que o senti afastar-me, ao mesmo tempo que insistia que tudo o que estava a dizer era verdade e, apesar de eu ter as minhas dúvidas, limitei-me a assentir.
- Sim, vamos dormir.- concordei, começando a levantar-me calmamente. Aquele dia tinha sido demasiado longo. Passei ambas as mãos pela cara, ao mesmo tempo que soltava um suspiro, e voltei depois a olhá-lo.- queres dormir aqui ou queres...- mordi o lábio inferior de forma distraída.- ou queres dormir comigo?

Desviei o meu olhar do seu e esfreguei os meus olhos, sentia-me a ficar cada vez mais cansado e cada vez sentia a minha cabeça numa maior confusão. Só precisava de dormir e sabia que no dia seguinte talvez me fosse sentir muito melhor. O meu olhar voltou a encontrar o da Emilly assim que a ouvi e limitei-me a encolher os meus ombros, sem saber, muito sinceramente, o que lhe responder. - Como tu preferires. - acabei por murmurar.

Só depois de ouvir a resposta de Dylan é que me apercebi do quão estúpida tinha sido a minha pergunta. Mas a quem é que eu queria enganar? Eu ia sempre querê-lo por perto, aliás, esse era o meu problema.
- Anda.- estiquei uma mão na sua direcção, para o ajudar a levantar.- o sofá é demasiado duro.- murmurei, pousando-lhe a chávena de café em cima da mesinha de centro e, assim que se conseguiu levantar, abracei-lhe e cintura com um braço, começando a conduzi-lo até ao meu quarto.

Assim que ouvi o que ela disse, mordi o interior da minha bochecha e agarrei depois na sua mão, para dessa forma eu me levantar do sofá. Respirei fundo quando senti a minha cabeça a andar às voltas e acabei por me segurar a ela, caso contrário o mais certo era acabar por cair no meio do chão. - Obrigado... - murmurei baixo enquanto deixava que ela me levasse consigo para o seu quarto.

Assim que consegui conduzir-nos até ao meu quarto, felizmente sem que nenhum de nós caísse, ajudei Dylan a sentar-se na cama, começando logo de seguida a desapertar-lhe a camisa. Apesar do cheiro do álcool ser mais dominante do que todos os outros, conseguia sentir o seu cheirinho ali, tão perto de mim, e isso, estava a fazer-me mais confusão do que nunca. Dei por mim a mordiscar o meu lábio inferior de forma distraída, à medida que o seu peito ia ficando despido e juro que tentei concentrar-me no que estava a fazer. Para todos os efeitos, continuava confusa com tudo aquilo. Sim, mais do que chateada eu sentia-me confusa, acho que era isso. Abanei ligeiramente a cabeça, suspirando pela milésima vez, e depois de pousar a sua camisa em cima do cadeirão que tinha no quarto, baixei-me à sua frente, para lhe desapertar os sapatos e lhe tirar as calças, até ele ficar apenas de boxers.
- Pronto, já podes descansar.- disse, puxando os lençóis para trás, para que ele se pudesse deitar.- eu já volto.- e antes que os meus olhos me atraiçoassem novamente, virei costas para entrar na casa de banho.

Deixei que ela me guiasse até ao seu quarto, e quase sem dar por isso, uns instantes depois eu estava já sentado sobre a sua cama. Permaneci quieto e em silêncio enquanto ela ia despindo as minhas roupas e esfreguei um pouco os meus olhos, começava agora a sentir o sono apoderar-se do meu corpo e a minha maior vontade era de dormir. Assenti um pouco com a cabeça assim que ela terminou e logo depois o meu olhar seguiu-a até ela entrar na casa de banho. Suspirei baixinho e deixei o meu corpo cair sobre a cama, puxei os lençóis para cima, tapando-me um pouco e de seguida tentei manter-me acordado enquanto esperava que ela voltasse para o quarto.

Apesar de tudo, apesar da confusão que tinha sido esta noite, sentia-me extremamente cansada. Não só física, mas também mentalmente. Por um lado, não conseguia parar de pensar nas palavras de Dylan, mesmo sabendo que não passavam de meras confissões de um bêbado mas, por outro, não era quando estávamos neste estado que a nossa sinceridade vinha ao de cima? Eu já nem sabia o que pensar, por isso, era mesmo melhor não pensar em nada. Abanei ligeiramente a cabeça, ao mesmo tempo que saía da banheira e comecei logo a secar o meu corpo, enfiando pela cabeça a única t-shirt que servia de pijama. Arrumei a tolha no seu respetivo lugar, virando-me logo de seguida para o espelho e fiquei apenas a observar o meu rosto cansado enquanto lavava os dentes. O pior, ou o melhor no meio de tudo isto, era que pelo menos assim Scott já tinha percebido que eu não estava disponível, podia ser que assim mudasse a sua atitude. Sim, porque no que dependesse de mim, não íamos deixar de ser amigos por causa deste incidente, só esperava que acontecesse o mesmo do outro lado. Limpei a cara a uma pequena toalha que tinha pendurada à parede e, uma vez que já não havia mais nada a fazer, pude abrir a porta da casa de banho, deparando-me nesse mesmo instante com o corpo semi nu de Dylan na minha cama. Mordi o meu lábio inferior de forma instantânea, sentindo logo aquela impressão estúpida na barriga, mas rapidamente me esforcei por ignorá-la, apressando-me a deitar-me na cama, de costas para ele.
- Até amanhã.- só tens de fechar os olhos e dormir Emilly, tu consegues.

Permaneci em silêncio enquanto estava ali sozinho, tentava pensar nas coisas que lhe tinha dito, porém aquilo estava agora tudo tão confuso na minha cabeça que eu nem sequer conseguia pensar direito em nada. Estava mesmo a precisar de dormir. Abri os meus olhos, outrora fechados, quando ouvi um ligeiro barulho no quarto e percebi que ela tinha voltado a entrar no mesmo. Mordi o meu lábio ao senti-la deitar-se na cama e depois as suas palavras. - Até amanhã. - murmurei baixo, tão baixo que nem tive a certeza se ela me tinha conseguido ouvir. Suspirei baixinho e cheguei-me para mais perto dela, colocando um dos meus braços em volta do seu corpo e aconchegando-me contra ela.

E quando eu achava que os meus pensamentos e as minhas vontades estavam finalmente controlados, eis que sinto um dos braços de Dylan em redor do meu corpo, o que, será escusado será dizer, despertou sensações em mim que já me eram bastante familiares. Fechei os olhos de repente, inspirando bruscamente à medida que o fazia mas quando dei por mim, já o meu corpo se estava a aconchegar contra o seu, ignorando por completo o cheiro a álcool que emanava do seu lado. Pousei calmamente uma mão sobre a sua, apertando-o contra mim e acabei mesmo por entrelaçar os nossos dedos. Tu não aprendes, pois não Emilly? Voltei a suspirar, pela milésima vez, mas a verdade é que, apesar da vontade que eu tinha de o beijar, assim que o meu corpo se permitiu relaxar em contacto com o seu, eu adormeci num instante, completamente embalada no seu calor humano.

Um pequeno sorriso apareceu nos meus lábios assim que eu percebi que ela não se ia afastar de mim, ao contrário do que por momentos eu cheguei a temer. Suspirei baixinho e fechei por fim os meus olhos, deixando-me depois ser logo levado pelo sono. Algo que não foi nada difícil, visto estar a sentir-me completamente cansado não apenas fisicamente mas também psicologicamente. E bem, estava mesmo a precisar de este dia chegasse ao fim, tinha sido demasiado longo.

Visto que não tinha sido eu a embebedar-me perdidamente, senti o meu corpo despertar mal os primeiros raios de sol começaram a iluminar todo o quarto. Abri os olhos devagarinho, remexendo-me de forma sonolenta contra algo quentinho que me prendia e só quando me virei para o outro lado, é que percebi que era Dylan. Sorri levemente, esticando ligeiramente a cabeça até lhe conseguir beijar o queixo e depois soltei-me com cuidado dos seus braços, levantando-me da mesma forma. Ou eu muito me enganava ou ele ia acordar com uma dor de cabeça daquelas insuportáveis, por isso, tomei a iniciativa de lhe ir preparar um café. Enchi a chávena depois de este estar pronto, tendo cuidado para não me queimar e, assim que voltei para o quarto, ainda ele dormia. Sentei-me na pontinha da cama, virada na sua direcção e pousei a chávena na mesinha de cabeceira ao seu lado, pousando de seguida uma das minhas mãos sobre o seu braço.
- Dylan.- chamei baixinho, visto que estava consciente da sua ressaca.- acorda.

Tinha acabado por dormir demaisado bem, o que era normal, visto que estava tão cansado. E além disso dormir ali com a Emilly também ajudava para ter uma boa noite de sono. Remexi-me um pouco na cama quando senti algum movimento no interior do quarto e depois a voz dela a chamar pelo meu nome. - Hm? - murmurei, porém sem me mexer ou sem sequer abrir os olhos. Suspirei longamente começando a sentir algumas dores de cabeça assim que comecei a despertar do meu sono, e tentei abrir os olhos que pareciam estar pesados demais naquele momento.

Apesar de já saber que ia demorar, tentei esperar o mais calmamente possível até que Dylan decidisse acordar. Conseguia ter uma pequena noção da grande ressaca que ele tinha.
- Anda, senta-te, fiz café.- disse, depois de ouvir o seu murmuro e sentei-me mais na pontinha da cama, para que ele se pudesse sentar.- se não aguentares a cabeça diz-me que eu vou buscar um comprimido.- completei, subindo o meu olhar para o seu enquanto ele se sentava.- como estás?