Hospital

- Gostava de ser actor... - disse com um pequeno encolher de ombros. - Claro que esta ideia não agrada nada ao meu pai, porque ele quer que eu me junte a ele na empresa. Mas pronto, logo se vê. - encolhi de novo os ombros, não dando importância àquele assunto. Ri-me com a cara que ela fez devido ao café. - Já devias saber que as coisas do hospital nunca são lá muito saborosas. - retorqui e acabei por pôr o meu café de lado, visto que já não o pretendia beber. Peguei numa das fatias de bolo e olhei para a Mia. - É para comeres as fatias todas, estás muito magra. - fiz uma careta olhando para ela, e depois comecei a comer o meu bolo, aos bocados. - É assim tão estranho eu não ter namorada? - perguntei de sobrolho franzido. Esbocei um meio sorriso. - Croma ou não, tenho a certeza que não será difícil arranjares alguém. - encolhi os ombros. - Apaixonar-me a sério, mesmo a sério, não. - acabei por dizer. E tinha um bocado de dúvidas de que isso alguma vez fosse acontecer, na verdade, nem sequer sabia se acreditava mesmo no amor e nessas tretas todas.

-Oh a sério? Porque não tentas nadas? – Olhei-o nos olhos e um sorriso surgiu-me nos lábios. – oh…já és grandinho, podes decidir por ti. Ora essa. – Resmungona como era tive que o fazer, fi-lo contra o seu peito e fechei os olhos inspirando o seu cheiro que levemente me começava a habituar. Estava tão grande…já tínhamos perdido 20 anos separados, era muito difícil criar laços tão fortes como se crescêssemos juntos, mas valia a pena tentar. Remexi-me na cama com todo o cuidado para não me magoar e petisquei novamente uma das fatias. – É…eu não como muito. – Encolhi o ombros e fitei a televisão desligada, ultimamente não comia rigorosamente nada pois estava focada em acabar o curso rapidamente, faltava-me um ano apenas. Exijo muito de mim, perfeccionista de defeito tentava sempre nunca errar e dedicava-me por completo a tudo o que fazia. – Vou levar isso da muito magra, como um elogio. – Deitei-lhe a língua fora e esbocei um leve sorriso. – Sim é muito estranho não teres namorada, muito mesmo. Hm…algo que me queiras contar? – Gargalhei um pouco com cuidado para as dores não retornarem e fitei-o com um ar brincalhão, estava a gozá-lo. – É... toda a gente me diz isso, vais me dizer que também não acreditas no amor não é? Que isso a ti não te vai acontecer, lamento informar-te que são essas pessoas, como vocês, teimosos e pouco recetivos a cenas desse tipo que acabam por se apaixonar e casar mais cedo.

Encolhi ligeiramente os ombros ao que ela disse.
- Talvez depois tente, e sim, eu sei que eu é que decido o que quero mas sei lá, não quero decepcioná-lo... - disse num tom de voz um pouco mais baixo. - Mas deixa lá isso. - acrescentei, pretendendo que aquele assunto terminasse por ali. Continuei a comer e assim que terminei aquela fatia de bolo, peguei logo noutra. Até que estava bom e isso era um pouco fora no normal. - Mas devias comer, mais do que comes. - apesar de praticamente ainda não  a conhecer, já tinha conseguido perceber aquilo. - E não era para levares como um elogio. - resmunguei de olhos semicerrados.
Arqueei uma sobrancelha e abanei a cabeça. - Não, não há para contar, porque haveria de haver? - perguntei meio confuso e esbocei um sorriso. - Pois não acredito. - encolhi os ombros. - E tenho mesmo dúvidas de que me vá acontecer, mas "nunca digas nunca". - revirei ligeiramente os olhos e depois fiquei a olhar para Mia, por momentos em silêncio. - Sabes, apesar de nos termos acabado de conhecer, parece que já te conheço à mais tempo. É estranho. - disse, se calhar aquilo era uma coisa de irmãos, ou algo do género. Estavamos a falar com tanta normalidade um com o outro e tudo isso que parecia que já a conhecia à muito mais tempo do que na realidade conhecia.

Pús o meu braço à volta dela, tentando assim abraçá-la, de maneira um pouco desajeitada, mas mesmo assim não deixava de ser um abraço.
- Quem te ouvir falar, até parece que és gorda. - revirei ligeiramente os olhos quando percebi que ela não ia mesmo comer mais bolo. Acabei por nem dizer nada, pois tinha a certeza que não ia adiantar de nada. Acabei por pousar também o resto do meu bolo, não estava com muita fome e o que tinha comido já chegava por agora. - Não sei, depois veremos. - disse com um meio sorriso. - Mas de certeza que a ti acontecerá primeiro. - brinquei com ela e acabei por me ajeitar melhor em cima da cama. - Se estiver a ocupar-te demasiado espaço, podes dizer. - avisei-a e apertei-a mais para mim de seguida. - Claro que é. Até porque por momentos cheguei a pensar que nunca nos iamos dar bem um com o outro. - retorqui referindo-me a quando ela tinha ido falar comigo lá no clube de equitação. Olhei de imediato para a televisão quando de repente esta começou a fazer barulho e uma imagem surgiu no ecrã. - Gosto, mais ao menos. - ri-me levemente e acabei por ficar a olhar para a televisão.

Sorri levemente devido às coisas que Mia ia dizendo. Gostava bastante dela, apesar de nos conhecermos à muito pouco tempo, já conseguia dizer que gostava bastante dela. Era uma pessoa fácil de se gostar e o facto de sermos irmãos, talvez tornasse isso ainda mais fácil.
- És uma exagerada. - disse quando ela me disse que cabiam ali mais três Mia's. Encolhi ligeiramente os ombros. - Acho que quando estámos irritados, todos acabamos por ser um pouco assim. - acabei por dizer e fiz uma careta devido ao que ela disse sobre a nossa mãe. Se ela fosse como me tinha descrito que era a nossa mãe, eu duvidava mesmo que nos fossemos dar bem. Ainda bem que não era, e ainda bem que eu também não era. Acho que saía ao meu pai, nessas coisas.

Os dias foram-se passando entretanto, e finalmente chegou o dia em que Mia poderia sair daquele hospital. Felizmente ela já estava bastante melhor e aquele acidente com o cavalo não tinha deixado mazelas permanentes. Agora era apenas mais uma questão de dias para que Mia voltasse a ficar a cem por cento. Precisava era de descansar e eu esperava mesmo que ela fizesse isso. Se bem que eu pretendia andar meio em cima dela, para ver como se comportava mas não queria exagerar para não me pôr a invadir o seu espaço.
- Olá. - disse para Mia, assim que ela entrou dentro do carro, depois de ter ficado ali apenas uns breves instantes à sua espera. - Não sei... estava a pensar que irias querer ir para tua casa. Mas se quiseres ir para outro sítio, tudo bem. - disse com um sorriso enquanto saía dali e começava a conduzir para a zona da estrada.

Estava radiante por sair do hospital, embora ainda com dores sentia-me bastante agradecida pelo que tinha acontecido lá dentro. Nunca acreditei muito em Deus, mas desta vez acho que algo do outro mundo me tinha coadjuvado, pois não havia chances muito favoráveis para o meu lado.  Agitei a minha cabeça de forma a libertar todos aqueles pensamentos estúpidos. Mal entrei no carro apreciei a boa música que saia das pequenas colunas do mesmo, sentei-me e após cumprimenta-lo coloquei o cinto de segurança sobre o meu corpo. – Oh…vamos…comer, eu pago. – Esbocei um pequeno sorriso e olhei para a janela apreciando a vista. –Obrigada, por me vires buscar e …estares comigo. –  Agradeci sendo honesta quando o fiz, estava deveras grata por toda esta companhia que me tinha feito.
 

Encerrado.

-Não tenciono falar contigo, não te preocupes. - disse com encolher de ombros enquanto lhe fazia sinal para que andasse à minha frente.

Olhei para ele.
- Podes ficar cá fora, eu vou sozinha. - avisei-o, não queria que se armasse em meu pai ou irmão, eu conseguia ir sozinha.

-Eu entro contigo no hospital e fico a ver-te entrar no gabinete. -disse. Estava a ter piada a resistência dela.

Respirei fundo. - Fica ai fora, eu vou lá. - disse com um ar sério e desapareci para dentro do hospital e fui ao balcão de atendimento.

Calmamente caminhei atrás dela mas mantive alguma distância quando ela parou. Sentei-me numa das cadeiras e fiquei a olhar para Alyssa a falar com a recepcionista.

Puxei a camisa mais para baixo quando me encostei ao balcão. Isto ia demorar, estava cheio, pelo que a recepcionista dizia...

Levantei-me ao perceber que ainda ia demorar até Alyssa ser atendida. Aproximei-me da recepção e sussurrei algo ao ouvido da recepcionista. Vi-a a pôr a ficha de Alyssa nos primeiros lugares e sorri.
-Espero que tenhas noção que acabaste de me valer um jantar com aquela feiosa. -sussurrei ao ouvido de Alyssa.-Mas és a próxima.

Fiquei a olhar para ele feita parva mas acabei por me rir. - Não tenho nada a ver com isso. - fiz-me de desentendida e acabei por me sentar naquelas cadeiras velhas da sala de espera e suspirei. Odiava estar aqui, e tinha logo que me ter trazido para aqui.

Sentei-me numa cadeira e fechei os olhos, estava farto de cá estar.
-Alyssa Pierce. - ouvi-se nas colunas.

Estremeci assim que o meu nome soou naquelas colunas velhas sempre com o mesmo ruído e acabei por me levantar devagar e dirigir-me pelo grande corredor por trás das duas portas de madeira.
Como eu tinha a certeza, estava tudo bem, o médico só me tinha receitado uns comprimidos para as tonturas e depois de algum tempo lá dentro, já estava de volta à pequena sala de espera, onde me aproximei de novo de Jason. - Vamos? - perguntei. Amanhã passava pela farmácia.

Tinha adormecido mesmo ali na cadeira e apanhei um susto quando ela falou comigo.
-Oh sim... Vamos. - disse despertando e levantando-me. -É preciso levar-te no ombro e trancar a porta de novo?

Acabei por me rir quando percebi que ele estava a dormir na sala de espera. - Acho que foste a primeira pessoa que vi a dormir numa sala de espera em tão pouco tempo que lá estive dentro. - comentei rindo-me. Acabei por fechar mais a sua camisa quando saimos para a rua, visto estar frio, e eu ser muito friorenta. - Não, eu vou.

-Tens noção de quantas horas eu passei na estrada hoje? - perguntei destrancando o carro e entrando. Estava totalmente exausto.

Entrei no carro e voltei a olhar para ele. - Eu bem te disse que não era preciso virmos. - resmunguei e coloquei o cinto pouco depois.

-Os teus pais pediram-me e além disso tu caíste a fazer um bolo, se morresses eu ia ficar com um enorme peso na consciência. - disse enquanto punha o cinto e ligava o carro. -Mas apesar disso teres caído foi bem feito por seres antipática.

Suspirei e permaneci um tempo calada, na esperança de arranjar uma boa resposta. - És tu que me fazes ser assim. - disse de forma seca.